(...)
Entretanto, a cruz vem antes da coroa e amanhã é segunda-feira de manhã. Abriu uma fenda nas muralhas impiedosas do mundo, e somos convidados a seguir o nosso Capitão lá para dentro. Segui-Lo é, obviamente, o ponto essencial. E assim sendo, poderá ser perguntado sobre qual a aplicação prática destas especulações com que nos temos presenteado. Consigo lembrar-me de pelo menos uma aplicação. É possível que cada um pense demasiado na sua potencial glória na próxima vida; é mais dificilmente possível que se pense o mesmo com demasiada frequencia ou profundidade em relação ao seu próximo. A carga, ou o peso, ou o fardo da glória do meu próximo deve ser depositada nas minhas costas, uma carga tão pesada que só a humildade pode carregá-la, e as costas dos orgulhosos cederão. É uma coisa séria viver numa sociedade de possíveis deuses e deusas, lembrar que a pessoa mais aborrecida e desinteressante com que possas ter falado, um dia poderá ser uma criatura que, se a visses agora, sentir-te-ias fortemente tentado a adorá-la, ou então, um horror e uma corrupção tal que agora apenas podes conhecer, se tanto, num pesadelo. Durante todo o dia estamos, em algum grau, a ajudarmo-nos uns aos outros para um ou outro destes destinos. É à luz destas possibilidades esmagadoras, é com a reverência e a circunspecção que se lhes adequa, que devemos orientar o nosso trato uns com os outros, em todas as amizades, em todos os amores, em todas as brincadeiras, em todas as políticas. Não existem pessoas comuns/vulgares/ordinárias (ordinary). Tu nunca falaste com um mero mortal. Nações, culturas, artes, civilizações – estas são mortais, e as suas vidas estão para as nossas como a vida de um mosquito. Mas é com imortais que brincamos, trabalhamos, casamos, desprezamos e exploramos – horrores imortais ou esplendores eternos. Isto não sgnifica que devamos ser perpetuamente solenes. Devemos brincar. Mas o nosso divertimente deve ser daquele tipo (e é, de facto, o mais divertido) que existe entre pessoas que, desde o princípio, se levaram a sério mutuamente – sem frivolidade, sem superioridade, sem presunção. E a nossa caridade deve ser um amor real e custoso, profundamente sentidos pelos pecados apesar dos quais amamos o pecador – não mera tolerância ou indulgência que caricaturam o amor, da mesma forma que frivolidade caricatura a diversão. A seguir ao próprio Santo Sacramento, o teu próximo é o objecto mais santo que é apresentado aos nossos sentidos. Se o teu próximo for Cristão, ele é santo quase da mesma maneira, porque nele também a vere latitat de Cristo – o glorificador e o glorifiado, a própria personificação da Glória, está verdadeiramente escondiada.
The Weight of Glory
Entretanto, a cruz vem antes da coroa e amanhã é segunda-feira de manhã. Abriu uma fenda nas muralhas impiedosas do mundo, e somos convidados a seguir o nosso Capitão lá para dentro. Segui-Lo é, obviamente, o ponto essencial. E assim sendo, poderá ser perguntado sobre qual a aplicação prática destas especulações com que nos temos presenteado. Consigo lembrar-me de pelo menos uma aplicação. É possível que cada um pense demasiado na sua potencial glória na próxima vida; é mais dificilmente possível que se pense o mesmo com demasiada frequencia ou profundidade em relação ao seu próximo. A carga, ou o peso, ou o fardo da glória do meu próximo deve ser depositada nas minhas costas, uma carga tão pesada que só a humildade pode carregá-la, e as costas dos orgulhosos cederão. É uma coisa séria viver numa sociedade de possíveis deuses e deusas, lembrar que a pessoa mais aborrecida e desinteressante com que possas ter falado, um dia poderá ser uma criatura que, se a visses agora, sentir-te-ias fortemente tentado a adorá-la, ou então, um horror e uma corrupção tal que agora apenas podes conhecer, se tanto, num pesadelo. Durante todo o dia estamos, em algum grau, a ajudarmo-nos uns aos outros para um ou outro destes destinos. É à luz destas possibilidades esmagadoras, é com a reverência e a circunspecção que se lhes adequa, que devemos orientar o nosso trato uns com os outros, em todas as amizades, em todos os amores, em todas as brincadeiras, em todas as políticas. Não existem pessoas comuns/vulgares/ordinárias (ordinary). Tu nunca falaste com um mero mortal. Nações, culturas, artes, civilizações – estas são mortais, e as suas vidas estão para as nossas como a vida de um mosquito. Mas é com imortais que brincamos, trabalhamos, casamos, desprezamos e exploramos – horrores imortais ou esplendores eternos. Isto não sgnifica que devamos ser perpetuamente solenes. Devemos brincar. Mas o nosso divertimente deve ser daquele tipo (e é, de facto, o mais divertido) que existe entre pessoas que, desde o princípio, se levaram a sério mutuamente – sem frivolidade, sem superioridade, sem presunção. E a nossa caridade deve ser um amor real e custoso, profundamente sentidos pelos pecados apesar dos quais amamos o pecador – não mera tolerância ou indulgência que caricaturam o amor, da mesma forma que frivolidade caricatura a diversão. A seguir ao próprio Santo Sacramento, o teu próximo é o objecto mais santo que é apresentado aos nossos sentidos. Se o teu próximo for Cristão, ele é santo quase da mesma maneira, porque nele também a vere latitat de Cristo – o glorificador e o glorifiado, a própria personificação da Glória, está verdadeiramente escondiada.
The Weight of Glory
C. S. Lewis
1942 dC
1942 dC
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