(...)
O cristão, em relação ao Céu, está praticamente na mesma posição que o miúdo da escola. Aqueles que alcançaram a vida eterna na visão de Deus sem dúvida que sabem muito bem que não não é nenhum suborno, mas sim a consumação da sua vida terrena de discipulado; mas nós que ainda não a alcançámos não o podemos saber da mesma maneira, e não podemos sequer começar a saber, a não ser por continuar a obedecer e encontrar a recompensa inicial da nossa obediência na nossa capacidade crescente de desejar a derradeira recompensa. Na mesma proporção que o nosso desejo aumenta, o nosso medo de que seja um desejar mercenário diminuirá, até que finalmente o reconheçamos como sendo absurdo. Mas provavelmente isto não acontecerá, para a maioria de nós, de um dia para o outro; a poesia substitui a gramática, o Evangelho substitui a Lei, e o desejo transforma a obediência, tão gradualmente quanto a maré eleva um navio encalhado.
Mas há mais uma importante semelhança entre nós e o miúdo da escola. Se ele for um miúdo com imaginação, ele irá, muito provavelmente, deleitar-se nos poetas ingleses e romancistas adequados à sua idade algum tempo antes de começar a suspeitar que a gramática Grega o levará a um gozo cada vez maior do mesmo tipo. Ele poderá até negligenciar o Grego para ler Shelley e Swinburne às escondidas. Por outras palavras, o desejo que o Grego irá acabar por satisfazer já existe nele e está ligado a objectos que parecem não ter nada a ver com Xenofonte ou com os verbos em μι. Agora, se somos feitos para o Céu, o desejo para o nosso lugar adequado já existirá em nós, mas ainda não ligado ao verdadeiro objecto, e poderá até apresentar-se como rival desse objecto. E isto, penso eu, é apenas o que encontramos. Sem dúvida que há um ponto em que a minha analogia do miúdo da escola começa a falhar. A poesia Inglesa que ele lê quando deveria estar a fazer exercícios de Grego poderá ser tão boa quanto a poesia Grega para a qual os exercícios o direccionam, de tal forma que ao ficar-se pelo Milton em vez de se aventurar até ao Aquiles, o seu desejo não está a envolver-se com um falso objecto. Mas o nosso caso é muito diferente. Se um bem transtemporal, transfinito, é o nosso destino real, então qualquer outro bem no qual o nosso desejo se fixe deve ser, em alguma medida, falacioso; só poderá ter, na melhor das hipóteses, uma relação simbólica com o que realmente o satisfaz.
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The Weight of Glory
O cristão, em relação ao Céu, está praticamente na mesma posição que o miúdo da escola. Aqueles que alcançaram a vida eterna na visão de Deus sem dúvida que sabem muito bem que não não é nenhum suborno, mas sim a consumação da sua vida terrena de discipulado; mas nós que ainda não a alcançámos não o podemos saber da mesma maneira, e não podemos sequer começar a saber, a não ser por continuar a obedecer e encontrar a recompensa inicial da nossa obediência na nossa capacidade crescente de desejar a derradeira recompensa. Na mesma proporção que o nosso desejo aumenta, o nosso medo de que seja um desejar mercenário diminuirá, até que finalmente o reconheçamos como sendo absurdo. Mas provavelmente isto não acontecerá, para a maioria de nós, de um dia para o outro; a poesia substitui a gramática, o Evangelho substitui a Lei, e o desejo transforma a obediência, tão gradualmente quanto a maré eleva um navio encalhado.
Mas há mais uma importante semelhança entre nós e o miúdo da escola. Se ele for um miúdo com imaginação, ele irá, muito provavelmente, deleitar-se nos poetas ingleses e romancistas adequados à sua idade algum tempo antes de começar a suspeitar que a gramática Grega o levará a um gozo cada vez maior do mesmo tipo. Ele poderá até negligenciar o Grego para ler Shelley e Swinburne às escondidas. Por outras palavras, o desejo que o Grego irá acabar por satisfazer já existe nele e está ligado a objectos que parecem não ter nada a ver com Xenofonte ou com os verbos em μι. Agora, se somos feitos para o Céu, o desejo para o nosso lugar adequado já existirá em nós, mas ainda não ligado ao verdadeiro objecto, e poderá até apresentar-se como rival desse objecto. E isto, penso eu, é apenas o que encontramos. Sem dúvida que há um ponto em que a minha analogia do miúdo da escola começa a falhar. A poesia Inglesa que ele lê quando deveria estar a fazer exercícios de Grego poderá ser tão boa quanto a poesia Grega para a qual os exercícios o direccionam, de tal forma que ao ficar-se pelo Milton em vez de se aventurar até ao Aquiles, o seu desejo não está a envolver-se com um falso objecto. Mas o nosso caso é muito diferente. Se um bem transtemporal, transfinito, é o nosso destino real, então qualquer outro bem no qual o nosso desejo se fixe deve ser, em alguma medida, falacioso; só poderá ter, na melhor das hipóteses, uma relação simbólica com o que realmente o satisfaz.
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The Weight of Glory
C. S. Lewis
1942 dC
1942 dC
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