A qualquer homem, ao contactar pela primeira vez com uma nova arte, depara-se-lhe, a certa altura, algo que, erguendo a ponta do véu que esconde o mistério, revela, numa explosão de maravilha que o posterior entendimento total quase nunca chega a igualar, um lampejo das imensas possibilidades que lhe são inerentes. Para Ransom, esse momento ocorreu naquela altura, no que dizia respeito à sua compreensão das canções malacandrianas. De início reparou que o ritmo utilizado tinha por base a influência de um sangue diferente do nosso, de um coração que batia mais depressa e de uma temperatura interna mais elevada. O conhecimento que tinha das criaturas, e o amor que entretanto desenvolvera em relação a elas, fez que começasse a ouvi-las tal como cantavam. As primeiras estrofes do canto fúnebre, cantadas em notas baixas, acordando nele a sensação de grandes massas que se moviam a velocidades inconcebíveis, de gigantes dançando, de mágoas eternamente dissipadas por algo que desconhecia mas de que, apesar de tudo, tinha conhecimento, inundaram-lhe o espírito, como se as portas do céus se tivessem aberto diante dele.
Para Além do Planeta Silencioso
página 123
C. S. Lewis
1938 dC
Editora: Europa-América
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