O Cinismo, tanto como o Platonismo, constitui uma escola socrática. Visto Sócrates ter ensinado que o homem que viver com menos necessidades pode normalmente sobreviver em condições que aniquilariam outro homem que tivesse muitas necessidades, pretendiam os Cínicos que o ponto mais alto da virtude seria a carência de necessidades. Com o fim de serem independentes de qualquer desejo, procuravam eles abolir o desejo. Desprezavam todos os padrões e convenções e tornavam-se completamente individualistas. Muitas vezes eram propositadamente grosseiros e indecentes na linguagem e conduta só com o fim de demonstrar que eram «diferentes». A crítica que Sócrates fez a Antístenes, fundador da escola Cínica, constitui talvez a mais penetrante análise de todo o movimento já mais apresentada. «Posso ver o teu orgulho», disse ele, «pelos buracos do teu manto».
E por fim, sobre a escuridão dos telhados lustrosos, a luz fria da manhã tépida raia como um suplício do Apocalipse. É outra vez a noite imensa da claridade que aumenta. E outra vez o horror de sempre — o dia, a vida, a utilidade fictícia, a atividade sem remédio. E outra vez a minha personalidade física, visível, social, transmissível por palavras que não dizem nada, usável pelos gestos dos outros e pela consciência alheia. Sou eu outra vez, tal qual não sou. Com o princípio da luz de trevas que enche de dúvidas cinzentas as frinchas das portas das janelas — tão longe de herméticas, meu Deus! -, vou sentindo que não poderei guardar mais o meu refúgio de estar deitado, de não estar dormindo mas de o poder estar, de ir sonhando, sem saber que há verdade nem realidade, entre um calor fresco de roupas limpas e um desconhecimento, salvo de conforto, da existência do meu corpo. Vou sentindo fugir-me a inconsciência feliz com que estou gozando da minha consciência, o modorrar de animal com q...
Comentários