Também às vezes, quando o mestre espiritual, isto é, o confessor ou superior, não aprova o seu espírito e a sua maneira de agir, porque querem que se estime e se louve as suas obras, declaram que não são compreendidos. Segundo eles esse director não é um homem espiritual, dado que não aprova a sua conduta e não se presta a aceitar a sua maneira de ver. É por isso que logo concebem o desejo de ter um outro guia; tentam encontrar um que se acomode ao seu gosto; de facto, encontram normalmente aquele que eles julgam disposto a louvaminhar e estimar as suas obras. Fogem como da morte de quem, querendo repô-los no bom caminho, se oponha a tais obras: e acontece mesmo que, às vezes, lhe ganham a versão. Como são muito presumidos, fazem normalmente muitos projetos e agem pouco. Desejam algumas vezes que os outros conheçam o seu género de espiritualidade e a sua devoção, e movimentam-se muito para o efeito, soltam suspiros, tomam atitudes estranhas. Têm o hábito de expressar de vez em quando alguns arrebatamentos, mas mais em público do que em segredo, porque é o demónio que lhes dá a mão; comprazem-se quando esses efeitos extraordinários, que tanto lhes apetecem, são conhecidos à sua volta. Muitos procuram captar as boas graças e os favores do confessor; e daí nascem mil sentimentos de inveja e motivos de perturbações. Sentem repugnância em confessar claramente os seus pecados no receio de serem menos estimados pelo conversor; pintam-nos cor-de-rosa para atenuar a malícia e desculpam-se em vez de se acusarem. Algumas vezes irão procurar um outro confessor para lhes declararem o que têm de grave, acontecendo que o confessor habitual não encontra neles nada de mal ou só conhece o que há de bom. Mostram-se também muito contentes ao contarem frequentemente o que fazem de bem; fazem-no mesmo em termos exagerados, ou pelo menos com a intenção de que a sua obra pareça boa. Em todo o caso seria mais humilde, como diremos em breve, deixá-lo passar em silêncio e desejar que nem o confessor nem ninguém lhes dê importância.
A Noite Obscura [Noche oscura del alma]
Página 43
São João da Cruz
1579 dC
Editora: Estampa
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