Até mesmo por si só, uma palavra, um aglomerado de sons podem desencadear uma excitação sufocante (o célebre
faire catleya de Proust). A imagem desdobra-se no interior do som. A masturbação tem, assim, a sua gramática muda. Dentro desta privacidade, contudo, nos recessos do mais íntimo, intervém instâncias públicas. O vocabulário erótico e sexual dos
media, a gíria amorosa do cinema e da televisão, as vagas declaratórias da publicidade e no mercado de massa, estilizam, moldam segundo convenções o ritmo, o andamento, as componentes discursivas de milhões de parceiros sexuais. No mundo desenvolvido, com a sua pornografia corrosiva, são inumeráveis os amantes, particularmente entre os jovens, que «programam» o seu modo de fazer amor, façam-no conscientemente ou não, em termos semióticos pré-estabelecidos. O que deveria ser o mais espontaneamente anárquico, o mais individualmente revelador e inventivo dos encontros humanos, seguem em muito larga medida um
guião. A última liberdade, a autenticidade final, talvez seja, na verdade, a do surdo mudo. Não sabemos.
Os livros que não escrevi [My unwritten books]
Página 96
George Steiner
2008 dC
Editora: Gradiva
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