Wilson não se deixou seduzir por Estaline por muito tempo, mas nunca renegou a pureza essencial de Outubro. Por isso desempenhou o seu papel na grande degradação intelectual. É frequente aduzir-se certas condições históricas para explicar esta degradação. São elas: a ferida geracional deixada pela Primeira Grande Guerra (guerra convincentemente apontada como «imperialista», portanto, capitalista), a Grande Depressão de 1929-34, o advento do fascismo e depois do nazismo (e o envolvimento de ambos na Guerra Civil de Espanha) e, mais tarde, a força moral das baixas russas na Segunda Guerra Mundial. Mas o facto é que, a despeito «das provas cada vez mais volumosas e insofismáveis» do contrário (como escreveu o
meu pai nos meados dos anos cinquenta), a URSS continuou a ser considerada fundamentalmente progressista e benigna; e o erro resistiu até meados dos anos setenta. O que era isto? Do nosso ponto de vista actual, parece o contágio de uma falta de curiosidade selectiva, um quebra-cabeças iniciado por auto-hipnose e mantido pela histeria de massas. E embora a aberração fosse de séria utilidade política para Moscovo, tendemos mesmo assim a vê-la como bizarro e embaraçoso plano recuado dos principais acontecimentos. Não percamos a esperança de encontrar uma conexão mais estrutural.
Koba, o Terrível [Koba the Dread]
Página 44
Martin Amis
2002 dC
Editora: Teorema
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