Este estranho capitão era muitas vezes motivo de chacota por parte dos outros, que não conseguiam compreender um homem que orava, lia a Bíblia e escrevia cartas à mulher. “Eles pensam que não tenho uma noção certa da vida”, escreveu numa daquelas cartas, “e eu tenho a certeza que são eles que não a têm. Dizem que sou melancólico; e eu digo-lhes que estão loucos. Dizem que sou escravo de uma mulher, o que nego; mas posso provar que alguns deles são meros escravos de uma centena delas. Estranham o meu humor; eu compadeço-me do deles. Não têm a mínima ideia de felicidade”. Sobre esta última parte John sentia-se satisfeito porque, confessou, teria vergonha se tais homens, que “se contentavam com uma bebedeira ou com o sorriso de uma prostituta”, pudessem compreender a sua alegria.
E por fim, sobre a escuridão dos telhados lustrosos, a luz fria da manhã tépida raia como um suplício do Apocalipse. É outra vez a noite imensa da claridade que aumenta. E outra vez o horror de sempre — o dia, a vida, a utilidade fictícia, a atividade sem remédio. E outra vez a minha personalidade física, visível, social, transmissível por palavras que não dizem nada, usável pelos gestos dos outros e pela consciência alheia. Sou eu outra vez, tal qual não sou. Com o princípio da luz de trevas que enche de dúvidas cinzentas as frinchas das portas das janelas — tão longe de herméticas, meu Deus! -, vou sentindo que não poderei guardar mais o meu refúgio de estar deitado, de não estar dormindo mas de o poder estar, de ir sonhando, sem saber que há verdade nem realidade, entre um calor fresco de roupas limpas e um desconhecimento, salvo de conforto, da existência do meu corpo. Vou sentindo fugir-me a inconsciência feliz com que estou gozando da minha consciência, o modorrar de animal com q...
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